Método Suzuki: um relato de experiência no estudo de flauta doce

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por Amanda Meincke Melo, 29/03/2018

Quando comecei meus estudos de flauta doce, em uma escola luterana, em Cachoeira do Sul/RS, no final dos anos 80, tinha dez anos. Lembro-me de, inicialmente, ter aprendido alguns aspectos da notação musical, antes mesmo de iniciar a tocar alguma música. Logo, passei ao método Mönkemeyer, começando na flauta doce soprano e, cerca de dois anos depois, passando para a contralto. Em paralelo, tinha acesso a outras partituras – de diferentes estilos musicais – no mesmo nível de dificuldade. Leitura e interpretação seguiam juntas. Em alguns momentos, minha professora tocava comigo e, depois de algum tempo, minha irmã também. Logo no início, participei de alguns recitais, acompanhada de piano ou mesmo em duetos ou em grupo de flautas. Os ensaios com a pianista e outros estudantes ocorriam próximos aos recitais. As partituras eram minha principal referência nas apresentações. Sentia uma alegria em poder apresentar o meu progresso e, ao mesmo tempo, alguma tensão, insegurança, com a exposição.

Aos quinze anos, parei de estudar sistematicamente. Por pouco tempo, participei do grupo de flautas doces da Comunidade Evangélica de Confissão Luterana em Santa Maria/RS. A habilidade desenvolvida na leitura de partituras me conferia alguma autonomia para acompanhar o grupo. Nesse período, tive a oportunidade de experimentar outras flautas doces, como a tenor e a baixo. Passei, então, muitos anos sem estudar flauta doce, tocando eventualmente. O interesse pelos estudos retornou no período de pós-graduação (em Computação), em Campinas/SP, quando identifiquei outras pessoas interessadas no instrumento e fiz pesquisas de partituras nas bibliotecas da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Identifiquei, então, uma escola de música perto de casa, no centro da cidade. Fiz algumas aulas, mas não fiquei satisfeita em estudar com um professor que, embora pudesse me ensinar sobre teoria musical e tocar comigo, não tinha a flauta doce como seu primeiro instrumento.

Nessas experiências, não me recordo de exercitar a memorização das músicas como aconteceu já nas primeiras aulas no método Suzuki e, embora eu tenha tomado contato com as articulações T e D, o seu uso não era muito consciente. Em algum momento, a articulação R foi introduzida. Porém, não cheguei a explorar toda a riqueza que as articulações oferecem à interpretação.

Ao retomar os estudos de flauta doce, em 2015, não tinha muita clareza do que essa retomada exigiria de mim. Queria melhorar a interpretação, aprimorar o uso de articulações e ornamentos, apresentar maior agilidade na leitura e na execução, estudar a clave de Fá, ou seja, melhorar minha qualidade técnica em geral. Avançar! Avançar! Avançar! Procurei por uma professora altamente qualificada em flauta doce e, com ela – Renata Pereira, veio o método Suzuki – que apenas sabia existir, especialmente no ensino de violino em Santa Maria/RS.

Nas primeiras aulas, ao notar que eu deveria escutar as músicas de um CD e memorizá-las – não apenas a melodia, mas também as articulações e a interpretação –, sem apoio da partitura, fiquei muito ansiosa. Achei que não seria capaz de memorizar tantas músicas. Progressivamente, entretanto, adquiri novas habilidades, o que me trouxe grande alegria e sentimento de conquista. Porém, não via o momento de avançar e tocar músicas menos infantis e mais elaboradas, levando a algumas conversas (muito relevantes) a respeito do método e da importância de passar pelo Livro 1. Com isso, foi possível rever minha relação com a flauta doce e depositar mais confiança no trabalho desenvolvido pela professora.

Após cerca de um ano e meio dedicado ao Livro 1 de soprano e ao Livro 1 de contralto, chegou o tão esperado Livro 2. Hoje, já não tenho tanta pressa em prosseguir, tentando equilibrar o tempo necessário para amadurecer a interpretação de uma música e o tempo (exíguo) que tenho disponível para me dedicar aos estudos da flauta doce. Estou mais confortável com o repertório e tive a oportunidade de aprimorar uma das poucas músicas que já tocava de cor – o Minueto BWV Anh. 114, além de estar estudando belíssimas músicas.

Sobre as aulas a distância…

Moro em Alegrete/RS, localizada na fronteira oeste do Rio Grande do Sul (Figura 1). Em todo o município, não há professores (residentes) qualificados para o ensino do instrumento no nível de estudo em que estou. Assim, as aulas a distância são imprescindíveis para a continuidade dos meus estudos de flauta doce.

 

Figura 1. Mapa que permite perceber a distância entre Alegrete/RS e São Paulo/SP.

 

Embora apresente algumas limitações, como a impossibilidade de sincronismo para tocar com a professora e eventuais problemas na rede, é uma oportunidade única para ter o acompanhamento com uma professora extremamente qualificada. Para realização das aulas, utilizamos o Skype, que permite comunicação em vídeo, áudio, texto, assim como troca de materiais. Durante as aulas conversamos, interpreto músicas em estudo, escuto a interpretação da professora, recebo retorno do meu desempenho e orientações, repito trechos que necessitam de mais atenção. A principal dificuldade está na impossibilidade de acesso frequente a outras experiências oportunizadas pelo Centro Suzuki de Educação Musical de São Paulo (ex.: tocar com a professora, aulas em grupo, recitais). Os benefícios têm sido tantos que superam essas dificuldades.

Sobre as aulas presenciais…

As aulas presenciais são muito semelhantes às aulas a distância, mas permitem a adoção de outras estratégias como experimentar instrumentos, tocar juntas, anotações no próprio livro pela professora, e, possivelmente, facilitam à professora perceber nuances da minha interpretação. Além disso, é uma ótima oportunidade para estreitar a relação professora-aluna.

Sobre as aulas em grupo…

Em minha última ida a São Paulo/SP, no final de fevereiro deste ano, para realizar aulas presenciais, tive a oportunidade única de realizar duas aulas em grupo com o professor Gustavo de Francisco, no Centro Suzuki de Educação Musical. Na primeira aula, fiquei bastante emocionada em poder tocar, com outras três estudantes, duas músicas em várias vozes. Na ocasião, discutimos e experimentamos a sincronia necessária para iniciar a tocar em conjunto, além de interpretar a partir de partituras com diferentes vozes, observar e dialogar sobre essa interpretação. Na segunda aula, fui surpreendida com a proposta, bastante diferente da primeira: juntamente com outra estudante e o professor, tocamos – de cor – trechos de diferentes músicas ao mesmo tempo e, ao final da aula, cada uma escolheu uma música para apresentar aos demais colegas, refletindo e discutindo sobre formas para se preparar para uma situação de exposição.

Assim, ainda que de forma breve, foi possível interagir com outras estudantes – a maioria no mesmo nível de estudo e uma em nível mais avançado, ler partituras, interpretar, observar e dialogar sobre a interpretação coletiva, exercitar o poder de concentração, além do autoconhecimento e a exposição diante de pessoas desconhecidas. A experiência de tocar em grupo, em particular, não tem se mostrado possível localmente pela ausência (ou pelo desconhecimento) de pessoas comprometidas com o estudo da flauta doce.

Finalmente…

Tem sido uma experiência bastante significativa estudar pelo método Suzuki. Através dele, sem dúvida alguma, tenho aprendido muito, corrigindo a postura, exercitando a percepção, aprimorando a capacidade de memorização e valorizando a interpretação, com a leitura assumindo progressivamente seu lugar. Nesse processo, a ideia de avanço tem outro sentido.

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